O FIM, O
INÍCIO
escrevo
dor e enxergo a terra
em
toda sua extensão
homens
enlameados
carregando
o peso do ouro
nas
costas
e a fadiga dos lobos
e
o descanso terno dos gatos
escrevo
inferno e ele está aqui
sendo
criado a meus pés
retorcendo
as raízes
enterrando
o ar
escrevo
purgatório e ouço a voz
que
é do purgatório
é
ele quem grita poesia
poesia
poesia
o
purgatório é um homem extenuado
escrevo
céu e é o céu que traz noite
noite
e
mais noite ainda
e
traz a herança
o
sossego
eu
escrevo homem
e
o homem está aqui
escrevendo
paraíso
então
eu imagino o lugar
onde
estaremos
sem
jamais perceber
escrevo
terra e ela se levanta
sobe
sobe
e
envolve a você e a mim
como
num círculo
um
tufão dentro de um círculo
que
veste você
e
que veste a mim
escrevo
fogo
e
o fogo é o encanto
é
a flutuação
o
fogo tem a mesma densidade
das
nuvens
que
sonham com o frio
e
com a neve
escrevo
ar
e
desço
como
um suspiro
desço
com
a cabeça em seu colo
com
as mãos em seus seios
escrevo
água
e
o incêndio se espalha
por
todo o hemisfério norte
e
os animais em chamas
correm
correm
para
que eu possa continuar a escrever
infinito
e
o infinito são as páginas de um livro
que
me contam todos os assassinatos
deste
e do próximo século
e
eu caminho entre os mortos
eu
escrevo verbo
e
sua voz está lá
mãe
de misericórdia
cercando
tudo
até
encontrar meu centro
escrevo
silêncio
e
a espada desce
justamente
quando
estou de olhos vendados
e
escrevo caos
e
escrevo paz
e
escrevo frio e o frio é o seu ódio
é
o que você disse
que
sentia por mim
é
o que restou em mim
depois
depois
encontro
o velho amigo encharcado
de
álcool
e
escrevo noite
e
a noite é a imaginação
é
tudo aquilo que faz
com
que continuemos vivos
ou
mortos
tanto
faz
escrevo
calor e o calor é lembrança
suicídio
desesperança
e
reconciliação
eu
escrevo dia e o dia é a ternura
é
um coração que sangra
lentamente
no
mesmo ritmo
de
passos que se arrastam
para
longe
de
uma velha aldeia
escrevo
miséria e a miséria
é
um carrossel
é
uma família inteira voando
sem
conseguir pousar
e
escrevo liberdade
fé
ouro sopro melancolia
e
a melancolia é a verdade humana
assim
como quando
escrevo
música
escrevo
amor
essa
palavra cheia de medo
de
mágica e loucura
escrevo
despertar e o mundo desaparece
com
sua dor de mundo
ele
não está mais em nenhum lugar
que
não seja aqui
quando
escrevo desprezo
quando
escrevo medo
escrevo
oração reza prece
escrevo
solidão
(setembro/2012)
(Fotografia de Gilbert Garcín)
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