terça-feira, 18 de agosto de 2015

POESIA - LALO ARIAS



UMA CANÇÃO A MAIS 

sinto falta de um cinturão pesado
dois gatilhos ajudariam
preces nem pensar
não estou desesperado
só queria inventar canções
ainda ouço um cello
escrevo com quatro dedos
sobre as teclas do piano
vou aprender a abrir portas
está cada vez mais difícil
melhorar minha voz
mas um escudo
viria bem a calhar
não quero morrer velho
esta canção é demais
fica comigo, amor
vamos ser despachados
o mundo que nos devore
vou molhar as plantas
e já volto
ela disse
saí
pra comprar cigarros
e nunca mais me encontrei
filha, ouça
mal temos lenha
vamos caminhar pela mata
e colher nosso almoço
e saltar da pedra
durante o atabaque das águas
gosto muito das nossas mãos
enlaçadas
e do fósforo úmido
e da última bituca
quando peço paciência
quando peço
por favor
olhe pra mim
nunca ore por mim
sou só mais um animal da espécie
nunca fui além da esquina
nem caí no quintal
nunca chupei manga
enquanto a tarde fugia do dia
eu me lambuzava de amarelo
sem ouvir o barulho do tempo
têm horas que penso
é uma puta molecagem
esta vida de adulto

(agosto, 2014)
(escultura: Bernini)

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